quinta-feira, 16 de junho de 2011

BARCELONA 01: PRIMAVERA SOUND.

Em 2007, quando fiz um treinamento/vivência na Suplicy Cafés, em São Paulo, um senhor alto e idoso me marcou. Todo dia, chegava na mesma hora e pedia um café radicalmente específico. Na primeira vez que ele apareceu, eu estava na máquina. De imediato, ele chamou o barista, que sabia exatamente o que fazer. Imagino que deve ter sido trabalhoso explicar pela primeira vez aquilo que ele queria. Primeiro, o barista colocou muito mais pó de café do que o normal. Depois, na hora de compactar o café, ele se pendurou no tamper, o compactador do pó, colocando todo o peso do corpo pra fazer a compactação. Além disso, ele ficou pulando. Recomenda-se colocar um peso médio de 15 a 20 kg. O café saiu à conta gotas. O senhor bebeu virando a xícara, como se fosse cachaça, fazendo careta no final. Olhou pra mim, e disse: "Não aprenda assim, não, viu? Tá errado."


Minhas exigências como consumidor não são tão bizarras assim. Peço, geralmente, um cappuccino e um ristretto (o supra-sumo do espresso), às vezes um machiatto. Depende do meu humor. Nos primeiros três dias em Barcelona, a cidade foi aos meus olhos apenas metrô e apresentações musicais do Primavera Sound, festival de música. Tiveram shows de Pulp, Animal Collective, Flamming Lips, Belle & Sebastian, Ariel Pink, Battles. Foram três dias bem intensos, com uns seis palcos de shows simultâneos. O festival começava às cinco da tarde e ia até às cinco da manhã. Eu já preciso de café no dia-a-dia, imagine numa rotina dessas. Foda-se redbull, eu quero café.

Assim que entrei no espaço do festival, avistei, no mapinha que eles entregavam, um símbolo de uma xícara. Pra minha alegria, encontrei logo de cara duas máquinas de espresso grandes, com um quadro escrito "autêntico italiano". Achei que tinha me achado, mas a euforia durou até eu provar o café. Eu não falo portuñol, fiz três anos de curso de espanhol pra aprender espanhol. A proximidade com o português é uma cilada. Nesse primeiro dia, os catalães estavam tirando onda da minha cara. Não queriam me entender. Alguns odeiam falar castelhano. Tentei explicar pra barista o que queria. Eu queria um machiatto. Eles chamam machiatto de cortado. Eu disse: "leche no demasiado caliente, por favor". Ela pegou o leito frio e colocou dentro do meu café, com um sorriso no rosto, jurando que tava me satisfazendo plenamente. O café estava digno pra um quiosque e o leite frio não foi um desastre. Pior seria fervido, que fica doce. A lactose vira glicose quando o leite ferve.

No segundo dia, eu pedi quase da mesma maneira. A única diferença foi o "leche no muy caliente". A minha conclusão é que ela não tem sensibilidade na língua ou não ouviu o "NO!". O leite tava tão quente que passei umas três músicas do show do Deerhunter com o café na mão, sem conseguir tomar. Nesse dia, o ponto alto foi a destruição elegante de Ariel Pink e a volta de Pulp, com um ar something changed.



Último dia, uma dúvida batendo. Ver ou não ver a final da Champions League de Barcelona vs Manchester, no telão do festival. Tião, companheiro de viagem e Trincheira, convenceu-me de que aquilo não era só um jogo. Por estar em Barcelona, tinha virado outra coisa. Na verdade, o que tinha virado outra coisa foi o café do terceiro dia. Conseguiu piorar. Quando pedi o leite "no muy caliente", acrescentei que queria o danado com a temperatura de no máximo 75 graus. Pra quê? Ela pegou um café já pronto, um leite velho, misturou e me entregou. Setenta e cinco deve ser o seu número do azar. Desisti, fui ver o jogo.


O Barcelona ganhou e o show de Animal Collective foi sublime. Pensei que esse festival poderia ter sido na Itália.

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